Elio Gaspari escreve sobre Primeira Chance em sua coluna para a Folha de S.Paulo - Fundação Beto Studart Fundação Beto Studart

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Elio Gaspari escreve sobre Primeira Chance em sua coluna para a Folha de S.Paulo

A Associação Primeira Chance, uma das organizações apoiadas  pela Fundação Beto Studart, foi destaque no Jornal Folha de São Paulo, coluna do jornalista Elio Gaspari em 19 de janeiro de 2014.

Leia o texto completo a seguir: 


Os caçadores de cabeça do andar de baixo

Em 2011 um grupo de jovens executivos colocou-se a seguinte questão: o que se pode fazer para ajudar uma criança pobre que tem um brilhante desempenho escolar e enfrenta a lei da gravidade social que tenta retê-la no andar de baixo? Nasceu assim o ‘Primeira Chance’.

Ontem, em Fortaleza, cinco desses executivos passaram o dia entrevistando 35 jovens que cursam o ensino fundamental em escolas públicas. Quando tiverem terminado o serviço, estarão escolhidos os garotos e garotas que cursarão o ensino médio como bolsistas nas duas melhores escolas da cidade (Ari de Sá e Farias Brito). Resolvido? Como diria Fred Astaire, o segredo de um bom dançarino está em dar aos outros a impressão de que é fácil.

Os executivos do Primeira Chance ralaram. Como achar os garotos? Fácil. Selecionaram 250 crianças do ciclo fundamental bem colocadas em olimpíadas de conhecimento, como as de matemática, português, ciências e física. Como contatá-las? Pedindo ajuda às escolas? Não dá certo, muitos diretores temem que lhes queiram roubar os bons alunos. Mandando-se uma carta ao aluno, para o endereço do colégio, ele vai recebê-la. Resolvido? Nem sempre. Um garoto não tinha telefone (móvel ou fixo) em casa. Para chegar a ele foi preciso ligar para a residência onde sua tia trabalhava como empregada doméstica.

Em todo o processo, o Primeira Chance busca crianças que, além de terem bom desempenho, mostram uma surpreendente capacidade de batalhar pelo que querem. Um menino sem pai, com mãe e avó analfabetas, tinha medalha olímpica de matemática. Aos dez anos, soubera que na cidade da avó havia uns austríacos que ensinavam inglês de graça. Mudou-se para a casa dela. Seis anos depois, sua entrevista em Fortaleza deu-se em inglês. Ele também descobriu uma professora de matemática que lecionava para pobres e colocou-se sob sua proteção.

Das 250 cartas enviadas, tiveram 75 respostas e os candidatos foram convidados para uma prova e uma entrevista. A renda média de suas famílias era de R$ 1.000 por mês. Feito? Nada. Metade deles não veio. Um garoto que tinha duas medalhas de olimpíadas não poderia sair de sua cidade (Jijoca de Jericoacoara) a sete horas de Fortaleza, pois não tinha como pagar o ônibus. A turma do Primeira Chance cacifou as passagens e ele veio com o pai, que trazia consigo currículos para tentar um emprego de porteiro na capital, caso o filho se desse bem.

Catapultados para boas escolas como o Ari de Sá ou no Farias Brito, resolvia-se apenas uma parte do problema. Faltava o resto. Os colégios dão os livros, e o Primeira Chance cobre as despesas de material, transporte e alimentação. Em alguns casos, pagam também a hospedagem num pensionato. Um garoto jamais calçara sapatos, usava sandálias artesanais. Pela lei da gravidade, quando terminasse o ciclo fundamental, iria para a roça do pai.

Cada jovem amparado pelo Primeira Chance ganha um mentor que acompanha seu desempenho, com quem se comunica durante todo o tempo em que cursa o ensino médio e se capacita para o vestibular. Um bolsista custa R$ 4.000 por ano. Tendo começado em 2011, o grupo de executivos já deu 14 bolsas. O garoto que foi morar com a avó analfabeta para estudar inglês ganhou mais três medalhas olímpicas, foi aprovado nos vestibulares do Instituto Militar de Engenharia e do Insper, que oferece bolsas para jovens do Primeira Chance. O menino de Jijoca de Jericoacoara ganhou mais uma medalha na Olimpíada de Física e passou no vestibular do IME quando ainda cursava o segundo ano do ensino médio.

Nenhum dos executivos do Primeira Chance é milionário. Quase todos estão apenas devolvendo o que receberam da Viúva, pois estudaram em universidades públicas gratuitas, seis deles no Instituto Tecnológico da Aeronáutica. Alguns, ralando como os meninos que beneficiam. Além de um núcleo de 17 pessoas, têm a ajuda de 15 voluntários. A idade média do grupo está em menos de 30 anos. O que eles fazem não custa um tostão à Viúva, numa época em que dinheiro da Boa Senhora é usado para construir estádios e o Rio de Janeiro corre o risco de perder a maior faculdade de medicina do país -decadente, porém a maior.

Essa turma prefere que se divulgue mais o site do Primeira Chance do que seus nomes. O endereço é primeirachance.org. Vale lembrar que grandes universidades privadas americanas, interessadas em preservar a diversidade de seus alunos, despacham expedições para achar talentos.

Nunca é demais lembrar a frase de Andrew Carnegie, dono da maior fortuna dos Estados Unidos no final do século 19: ‘Morrer rico é uma desgraça’. Em dinheiro de hoje, ele distribuiu bilhões de dólares. Morava num palacete na esquina da rua 91 com a Quinta Avenida. É mais modesto do que o palácio erguido pelo barão de Nova Friburgo no Rio de Janeiro. A mansão de Carnegie foi doada ao governo. Repetindo, doada. O palácio do barão tentou virar hotel, faliu e acabou vendido à Presidência da República por algo como 15 milhões de dólares, em dinheiro de hoje. É o Palácio do Catete.

Vão aqui os nomes das empresas que, com recursos ou serviços, colaboram com o grupo do Primeira Chance:

Colégio Ary de Sá, Colégio Farias Brito, Instituto Ling, Fundação Beto Studart, escritório de advocacia Mattos Filho, Veiga Filho, Marrey e Quiroga, Yázigi, Adbat/Tesla, Locaweb, Curso Simétrico, Editora VestSeller, Accord, Sindicato da Escolas Particulares do Ceará, Sinepe, Organizze e Insper.

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